domingo, 21 de fevereiro de 2021

 Tudo acaba

Pouco falo de meu avô materno, Arthur. Talvez porque as lembranças que tenho dele sejam repetitivas.

Meu avô não era de conversas com crianças, estava sempre rodeado de adultos, pitando seu charuto.

Eu só falava com ele para pedir o refrigerante Grapette e ele, observando minha garrafinha vazia, interrompia a conversa dos grandes,  para me perguntar se eu queria outro. E me dava quantas mais eu quisesse.

Outro dia me peguei pensando mais em meu avô. Transportei-me até um de meus aniversários infantis quando parentes vieram em casa para as comemorações, que não passaram de uma bela mesa com bolo,  confeitado por minha mãe,  docinhos e guaraná, pois ninguém além do meu avô lembrar-se-ia de me comprar um Grapette.

Vovô Arthur me deu um curioso presente, recém lançado no mercado, que me encantou. Era uma caneta com quatro pontas, cada qual com uma cor diferente. A cada clique mudava a cor da ponta.

Eu, fascinada com o presente, examinava a engenhoca, ansiosa para mostrá-la às amigas da escola. 

Examinei por boas horas a caneta. Ao fim de um tempo, cheguei a meu avô e perguntei:

- Vô, esta caneta dura a vida toda? Ela acaba?

Ele, com leve sorriso, respondeu:

- Nada dura para sempre, querida, tudo acaba. 

Esse foi meu primeiro contato com a finitude da vida.

Suely - fev 2021